sábado, 15 de abril de 2023

A RE-evolução dos Bichos (conto de Claudio Lacet)

 

Introdução ao conto a RE-evolução dos Bichos, de Claudio Lacet

Em uma certa manhã conversávamos placidamente em minha casa eu e meu amigo Claudio Lacet sobre temas variados, desde o famigerado vírus – Covid 19, até a crueldade dos humanos com os animais. Eu lhe falei da minha ideia de escrever um conto em que começaria com uma festa na savana africana, com os animais, caça e caçadores, alegremente se confraternizando. O motivo teria sido o completo extermínio da raça humana causado por um vírus muitíssimo mais letal que o Covid. Seria uma trégua de uma semana, após a qual as relações entre os animais voltariam àquelas ditadas pela natureza. Qual não foi a minha surpresa quando, já na tarde daquele dia, o meu amigo, rápido no gatilho, me exibiu o conto que se segue, irretocável, e que estou postando a seguir.

A Re-evolução dos Bichos

(Autor: Claudio Lacet)

Num átimo avistou-se o pulo que o leão deu na zebra, bote certeiro. Mas não se tratava de um ataque e sim de um gesto de confraternização. Abraçavam-se como grandes amigos que há tempos não se viam. A leoa dançava can-can de braços entrelaçados com quatro hienas. A cascavel e o rato papeavam alegremente enquanto o novilho beijava alegremente uma sucuri.

Não havia rancores, nem nenhuma competição. Ninguém estava preocupado se era dia da caça ou do caçador. Muito menos queriam saber quem estava mais ou menos adaptado àquela região.

Mais e mais animais chegavam à festa. Convescote este que se repetia em todos os biomas e continentes do globo. Até na Antártica. Da savana africana o leão havia transmitido a ordem a todo o planeta: sete dias de confraternização e trégua entre todos os bichos que existem. O motivo? Como já havia advertido Camus, o ser humano mal havia se livrado de uma pandemia e comemorava a cura enquanto algo muito pior estava por surgir. Veio a nova peste que o eliminou de forma definitiva do planeta.

Durante a festa o jacu comentou:

- O homem se dizia o mais inteligente e humano dos animais, mas, se conseguia constantemente maltratar e matar os seus próprios semelhantes por pura maldade, ganância ou negligência, imagina o que ele acabava por fazer com outros animais? Algum dia a conta chegaria.

E a festa seguia. Cada vez mais e mais animada. Um bicho mais feliz que o outro. Mas de todos o mais alegre era, sem sombra de dúvida o sisudo corvo. Há anos não dava um sorriso, desde a morte da sua saudosa corva Lenora, outrora morta atropelada, jazendo buarquemente na contramão da estrada,  atrapalhando o trânsito. Mas naquele dia revoava, como um louco, de um lado para o outro, e gargalhava alegremente, e, com muito gosto, repetia, num grito que saia lá de dentro de sua nobre alma: “NEVERMORE, NEVERMORE”.

Postado aqui no blog, em 15/04/23, com o consentimento do autor.

------------------------------------------------------------------------------------------Notas (por José Antonio). Para os não lembrados ou que desconhecem certas citações do texto:

1-     Buarquemente na contramão da estrada, atrapalhando o trânsito – remete à genial composição de Chico Buarque de Holanda “Construção”.

2-     Camus- Albert Camus, em seu livro “A Peste”

3-     A corva Lenora – do imortal poema “O Corvo”, de Edgard Allan Poe

7 comentários:

  1. Nunca havia pensado num futuro pós-apocalíptico dominado pelos animais e achei justo por conta da nossa marca - crueldade, ganância, destruição ambiental, mudanças climáticas... Parabéns por incitar tema relevante de forma leve e despretensiosa!

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  2. NOTA: O comentário a seguir foi feito por Jonas Gleizer, no Facebook, e eu aqui o reproduzo com a devida autorização:.

    Excelente texto do Cláudio Lacet, uma utopia muito bem imaginada e muito bem escrita.
    Fazendo uma ilação com os seres humanos, ditos racionais, já seria um grande avanço se, estes, parassem com a violência e se confraternizassem, aceitando os opostos.
    Utopia.
    Mais fácil que ocorresse entre os animais, ditos irracionais, como ocorre no ótimo texto, escrito pelo Claudio Lacet.
    Parabéns ao Autor.

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  3. Obrigado, Zé e obrigado Jonas!

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  4. O ótimo texto do Cláudio Lacet, nos faz refletir como seria maravilhosa uma confraternização entre os humanos, comemorando a alegria de uma festa sem nenhuma sede de poder entre os participantes, respeitando o espaço, os limites e a opinião de cada um. Este conto é um exemplo de como os "animais" têm muito a nos ensinar, deixando claro quem são os irracionais de nossos sofridos tempos.
    Vivemos na contramão da estrada presenciando atos que nos envergonham e destroem nosso planeta. Será que ainda há tempo para reverter os malfeitos?
    Parabenizo o autor pela escrita irretocável e ao José Antônio pela publicação.

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  5. Obrigado Zé e obrigado Jonas!

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